Título
CONSULTA DE ENFERMAGEM PSIQUIÁTRICA COMO INSTRUMENTO TERAPÊUTICO PARA O CUIDADO DA CRIANÇA COM AUTISMO
Autores
Letícia de Sousa Eduardo (Relatora)
Jovelina Fernandes dos Santos
Hemeson Torres Mangueira
Bruna Araújo de Sá
Nívea Mabel Medeiros
Modalidade
Comunicação coordenada
Área
Enfermagem em Saúde Mental

Introdução: 
O termo autismo foi discutido em 1906 pelo psiquiatra Plouller, que descreveu os diferentes comportamentos apresentados por onze crianças, tais como: falta de contato emocional com outros indivíduos, formas atípicas de comunicação, fascinação por alguns objetos e destreza no manuseio, comportamento ansioso e possessivo, desejo de manter rotinas, evidências de inteligência, habilidades com jo-gos de encaixe e montagem e, especialmente, o sinal clínico de isolamento. Buscando reformular o termo, Leo Kanner, em 1943 passou a denominá-lo de distúrbio autístico, caracterizado como psicose da infância e pelo isolamento social (SUDRÉ et al.,2011). Tratando-se do autismo infantil, esse é considerado um Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD), segundo a nomenclatura de Classificação de Transtornos mentais e de Comportamento - CID-10, que afirma que a criança passa a manifestar os sinais antes dos três anos de idade e que compromete três áreas: comunicação, interação social e a presença de comportamento de interesses em atividades estereotipados e repetitivos (ZANATTA et al., 2014). Nesse contexto, os indivíduos que apresentam esse tipo de transtorno são atendidos no Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), especificamente no CAPS i, referência no atendimento de crianças e adolescentes portadoras de transtornos mentais. Desse modo, o enfermeiro deve atuar nesse serviço realizando a consulta de enfermagem, que é considerada uma potente ferramenta utilizada por estes profissionais nas suas ações assistenciais, além contribuir oferecendo subsídios históricos e relacionais com o indivíduo em sofrimento psíquico (BOLSONI et al., 2016).  Os profissionais de enfermagem além de direcionar as ações de saúde aos indivíduos com transtornos mentais devem incluir no plano terapêutico os familiares, ou seja, proporcionar  capacitação para que esses saibam enfrentar o sujeito durante a crise psiquiátrica, uma vez que muitos desconhecem o transtorno e resulta no desenvolvimento de sentimentos como insegurança, irritabilidade, sobrecarga de atividades e consequentemente colabora para o surgimento do estresse, que age influenciando o desenvolvimento de mudanças comportamentais e contribui no aparecimento de transtornos mentais. O tratamento para autismo não se limita apenas ao uso de psicofármacos, no alívio dos sinais e sintomas, o enfermeiro pode utilizar outras terapêuticas que são baseadas na estimulação da criança através do desenvolvimento das relações interpessoais, estabelecimento das relações com o mundo real, desenvolvimento da linguagem, por meio da comunicação com outros indivíduos, além de realizar ações voltadas para os familiares.

Objetivo:
Relatar a experiência acerca da consulta de enfermagem à criança com autismo. 

Método:
Trata-se de um estudo descritivo, do tipo relato de experiência, desenvolvido por discentes do curso de graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) a partir de uma consulta de enfermagem realizada nas atividades práticas da disciplina Enfermagem Psiquiátricas, no dia 26 de abril de 2017 com uma criança que possuía autismo infantil e seu familiar. O cenário de estudo foi o CAPS i, localizado no município de Cajazeiras, Paraíba, que é referência no atendimento a criança com transtornos mentais. Utilizou-se o instrumento para coleta de dados a consulta de Enfermagem Psiquiátrica, que aborda questões relacionadas à anamnese; identificação do paciente; Queixa Principal (QP); História da Doença Atual (HDA); História Pessoal (HP); História Familiar (HF); História Patológica Pregressa (HPP) e o Exame Psíquico (EP), pré-estruturada pela docente da disciplina. Para finalizar a consulta foram elaborados os planos de cuidados, diagnósticos de enfermagem, através do livro de Diagnósticos de Enfermagem da Associação Norte-Americana de Diagnósticos de Enfermagem (NANDA), de acordo com as necessidades apresentadas pela criança e posteriormente foram implantadas as devidas intervenções de enfermagem. 

Resultados: 
A consulta de enfermagem foi realizada com o paciente do gênero masculino, com idade de três anos, diagnosticado com TGD, segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais- DSM-IV 5, que situa o transtorno autista no quadro dos transtornos invasivos do desenvolvimento, conforme a CID -10 - F84.1. Realizava acompanhamento com psiquiatra, enfermeiro, psicólogo e terapeutas ocupacionais há quatro meses. No que tange à consulta de enfermagem, foi realizada inicialmente a anamnese, que consiste em sistematizar os dados do paciente, permitindo a orientação de determinada ação terapêutica. Sendo assim, realizou-se a identificação do indivíduo, os primeiros sinais e sintomas apresentados antes do diagnóstico psiquiátrico, dados sobre a infância, história fisiológica desde o nascimento, a progressão do comportamento, o relacionamento pessoal e familiar, questões sobre sexualidade e os tipos psicofármacos utilizados para o tratamento. A consulta desses dados foi importante, uma vez que permitiram correlacionar as informações cedidas com o transtorno mental que a criança apresenta.  Além disso, realizou-se a avaliação do exame psíquico, que tem a finalidade de avaliar a aparência, atitude, memoria, linguagem, pensamento, sensopercepção além de questões referentes ao envolvimento familiar no tratamento do paciente. Portanto, o indivíduo apresentou-se com aparência cuidada, atitude de oposição, ou seja, não cooperativo durante a consulta. Esses sinais são prevalentes no autismo; criança estava inconsciente, visto que não possuía noção do que estava ocorrendo dentro e fora de si mesmo; hipoprosexia, caracterizado pela diminuição da atenção ou enfraquecimento acentuado da atenção em todos os seus aspectos; afasia, compreendida como a perturbação da formulação e compreensão da linguagem; estereotipias motoras, que são movimentos motores repetitivos e desorganizados.  Vale salientar que alguns aspectos que contemplam o exame psíquico não foram possíveis de ser avaliados, tais como a memória, sensopercepção, o curso do pensamento e sua forma, devido às características apresentadas pela criança durante a consulta como: dificuldade para dirigir expressões faciais, utilização limitada de gestos para comunicar-se, introspecção, além de apresentar preferência por figuras e ob-jetos coloridos, o que lhe tirava o foco da consulta e impossibilitando uma profunda avaliação. Nesse contexto, buscando realizar o levantamento do histórico familiar, pois conforme Bolzani et al (2016), o conhecimento do cotidiano de famílias que convivem com indivíduo com transtornos mentas proporciona ao enfermeiro subsídios para planejar o cuidado voltado às necessidades da criança e da família. Sendo assim, identificou-se que a criança mora na zona rural, é o primeiro filho, proveniente de uma gravidez não planejada, e após o nascimento houve a separação dos pais. Ademais, a criança apresentou desde os dois anos de idade episódios epiléticos após um trauma ocorrido aos oito meses de idade, que contribui para o uso de psicoativos, que passaram a prejudicar o padrão de sono. A consulta de enfermagem permitiu que realizássemos ações educativas acerca do transtorno, enfatizando os principais  sinais e comportamentos característicos do autismo. Foi feito também a indicação a mãe, da leitura do livro “Mundo Singular” da psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva, a fim de colaborar no entendimento das diversas nuances do universo do autista, contribuindo desse modo para o preparo teórico, físico e emocional, pois a falta do preparo dessas áreas pode proporcionar desgaste físico e mental do sujeito que cuida, gerando, portanto, dificuldades em lidar com situações decorrentes do transtorno. Nessa perspectiva, após a realização da consulta de enfermagem foi possível desenvolver três diagnósticos de enfermagem de acordo com a NANDA. Comunicação verbal prejudicada relacionado ao transtorno mental e evidenciado pela dificuldade de verbalizar; padrão de sono perturbado relacionado a ansiedade decorrente da hiperatividade e evidenciado por relato verbal da mãe; convulsão relacionada ao trauma físico ocorrido e evidenciado por relato verbal da mãe. Para estes diagnósticos, foram implementadas as seguintes intervenções de enfermagem: utilizar técnicas de comunicação simples e breves, encaminhar para o profissional especializado como o fonoaudiólogo, utilizar técnicas de comunicação terapêutica para auxiliar a criança a expressar pensamentos e sentimentos; realizar medidas relaxantes como a musicoterapia, orientar quanto a ingesta de alimentos de difícil digestão próximo ao horário de dormir, realizar banho morno, manter o local calmo e acolhedor, diminuir a iluminação do ambiente; colocar a criança em decúbito lateral para facilitar a drenagem da secreção e impedir a broncoaspiração, afastar dos objetos capazes de causar traumas, observar a duração do episódio convulsivo, proteger a cabeça da criança com travesseiros.

Considerações finais:
A consulta de enfermagem ao indivíduo com autismo infantil permitiu um melhor envolvimento dos estudantes no tratamento do paciente. Sendo assim, o processo educativo desenvolvido no decorrer da experiência proporcionou a apreensão da importância do enfermeiro como educador.  Além disso, foi evidenciado que os profissionais de enfermagem não adotam nas suas práticas laborais a consulta de enfermagem, o que torna o processo de trabalho do enfermeiro fragmentado e direcionado a práticas tecnicistas e imediatistas, baseadas no modelo biomédico hegemônico. Portanto, a negligência da consulta de enfermagem psiquiátrica nos registros dos usuários desse serviço intervém diretamente na qualidade da assistência prestada ao paciente com transtorno mental, bem como contribui para a invisibilidade do enfermeiro. Faz-se necessário, que os profissionais realizem capacitação a cerca da utilização dessa ferramenta para que se possa atuar com eficiência e eficácia em uma área complexa, porem dinâmica como é a saúde mental.

Descritores: Cuidados de enfermagem; Transtorno autístico; Psiquiatria; Enfermagem; 

Referências
BOLSONI, E. B; HEUSY, I.P. M;  SILVA, Z.F;  RODRIGUES, J; PERES, G. M; MORAIS, R.  Consulta de Enfermagem em Saúde Mental: revisão Integrativa. SMAD, Rev. Eletrônica Saúde Mental Álcool Drog. v. 12. n. 4. P. 249-59, 2016. 
FERNANDES, F.D. M; AMATO, C. A.L. H. Análise de Comportamento Aplicada e Distúrbios do Espectro do Autismo: revisão de literatura. CoDAS v. 25 n. 3. p. 289-96, 2013;
SUDRÉ, R.C. R; OLIVEIRA, R. F; FAILE, P.G.S; TEIXEIRA, M. B.  Assistência de enfermagem a crianças com Transtorno Global do Desenvolvimento (TGD): autismo. Arq Med Hosp Fac Cienc Med. V. 56 n. p.102, 2011.
TANUNURE, M. C; GONÇALVES, A.M.P. Sistematização da Assistência de Enfermagem : Guia Prático- 2ª Edição- Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2010.
TOWSEND, M. C. Enfermagem psiquiátrica: conceitos de cuidados. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2011. 
ZANATTA, E. A; MENEGAZZO, E; GUIMARÃES, A. N; FERRAZ, L; MOTTA, M. G. C. Cotidiano de famílias que convivem com o autismo infantil. Revista Baiana de Enfermagem.  v. 28, n. 3, p. 271-282, 2014.