Título
BUROCRACIA EXCESSIVA COMO FATOR INTERVENIENTE NA PRÁTICA GERENCIAL DO ENFERMEIRO DA ATENÇÃO BÁSICA
Autores
Geísa Batista Leandro (Relatora)
Leandro Nonato da Silva Santos
Paloma Karen Holanda Brito
Rayara Cibelle Ribeiro da Silva
Jaine da Silva Batista
Marcelo Costa Fernandes
Modalidade
Comunicação coordenada
Área
Enfermagem em Saúde Coletiva


INTRODUÇÃO
A organização dos serviços de saúde consolida-se por meio do gerenciamento desenvolvido pelo profissional responsável do setor, este por meio de suas atribuições utiliza de recursos para a efetivação da assistência prestada aos usuários do sistema de saúde. O Sistema Único de Saúde (SUS) tem por dinamicidade dos serviços a gerência, principalmente no que se refere aos profissionais de enfermagem, que são elementos essenciais para o bom andamento e organização das ações desenvolvidas no campo da Atenção Básica (AB). 

Nesse contexto, o gerenciamento é importante ferramenta para a consolidação do processo de trabalho em saúde, devendo ser desempenhado por profissional qualificado, com características de liderança e agregação de valores e atribuição dos demais envolvidos, almejando a construção de propostas ativas que vislumbre melhorias de atender as demandas da população na sua integralidade. A qualidade dos serviços, os atendimentos e os recursos disponíveis devem ser viabilizados e utilizados pelos profissionais, com vistas a atender as demandas apresentadas pela população, de modo que o gerenciador compreenda e busque alternativas para a melhoria da gestão (LORENZETTI et al., 2014). 

A gerência da Unidade Básica de Saúde (UBS) é elemento essencial para o bom andamento das ações planejadas pela equipe, dando condução ao processo de trabalho a todos os envolvidos dos cuidados à comunidade, função esta desempenhada pelo enfermeiro que assume a liderança para a articulação com os demais profissionais de forma autônoma influenciando fortemente nas decisões tomadas (SILVA et al., 2015). 

Porém, cabe destacar que há inúmeros fatores que interferem negativamente no cotidiano das práticas realizadas pelo enfermeiro na AB, tais como demanda excessiva, sobrecarga de atividades burocráticas, falta de insumos, influências dos modelos de assistência à saúde, que fomentam o distanciamento desse profissional com práticas gerencias coerentes com a realidade no qual o mesmo está inserido entre outros.

OBJETIVO
O trabalho objetiva analisar a burocracia excessiva como fator interveniente na prática gerencial do enfermeiro na Atenção Básica.

MÉTODO
Trata-se de um estudo de natureza descritiva com abordagem qualitativa, realizada na Atenção Básica no município de Cajazeiras, no estado da Paraíba. Os participantes dessa pesquisa foram os enfermeiros que compõem um total de 23 Equipes de Saúde da Família, lotadas nas 19 Unidades de Saúde da Família da Atenção Básica de Cajazeiras-PB. Foi adotado como único critério de inclusão na pesquisa, trabalhar há mais de um ano como enfermeiro na Atenção Básica. Foram adotados como critérios para exclusão, estar de férias, licença-maternidade ou afastado por alguma doença. 

A coleta de dados foi realizada mediante entrevista semiestruturada, sobre questões ligadas aos objetivos do estudo. Os dados obtidos nas entrevistas para esta pesquisa foram organizados por meio da técnica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), para a avaliação do conteúdo extraído das entrevistas dos enfermeiros, realizou-se uma leitura das falas com o propósito de compreender o conjunto das transcrições dos depoimentos. Posteriormente, foram necessárias leituras sucessivas para que fosse possível identificar os núcleos de sentido correlacionados às questões norteadoras que compõe o roteiro da entrevista semiestruturada. 

A pesquisa teve início após a aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Universidade Federal de Campina Grande campus Cajazeiras, sob o número do processo 1.642.763, acontecendo, entre os meses de julho e agosto de 2016, em local reservado nas Unidades Básicas de Saúde. A participação no estudo iniciou-se mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). 

RESULTADOS E DISCUSSÃO
Durante a coleta de dados e mediante a análise dos DSC, observou-se que os profissionais de enfermagem ocupam boa parte de seu expediente com as questões burocráticas, alegando ser uma função de sua responsabilidade e que por este motivo devem sempre estar atentos ao que acontece na unidade a qual gerencia. 

Evidenciou-se a grande quantidade de impressos a serem preenchidos, com isso comprometendo a assistência de qualidade e integral dos usuários, sugerindo que esta responsabilidade fosse compartilhada com outro profissional.  Nota-se que as questões burocráticas são de intensa responsabilidade e sobrecarrega o profissional de enfermagem, sendo este responsável de manter a unidade fornecida de insumos e garantir condições de atendimento aos demais profissionais e aos indivíduos que buscam pelos serviços.

O DSC apresentado a seguir foi construído mediante a fala de sete enfermeiros, que relataram como dificuldade para a execução da gerência é a sobrecarga burocrática: 

“Você vai perceber que a maior parte do nosso tempo o que toma mais é a parte do gerenciamento bem mais que qualquer outra. Então assim, é um trabalho que você tem que estar a pá de tudo, é muitas atribuições pra você, tem muita papelada, muita burocracia pra se resolver. Porque assim, eu acredito que na unidade deveria ter um administrador, uma pessoa responsável para gerenciar a burocracia da unidade, porque em alguns momentos que estou em atendimento tenho que pedir pro paciente muitas vezes aguardar um pouco pra resolver um problema e a burocracia na maioria das vezes fala mais alto que a assistência, no modo de falar [...] A burocracia é muita hoje em dia. E lidar com muita burocracia, muito papel, muita ficha dentro da AB é algo assim muito difícil.” 

Observa-se uma influência da teoria burocrática de Marx, Weber da década de 40, cuja proposta tinha, como princípio, a eficiência organizacional, isto é, mantinha um caráter racional e uma sistemática divisão de trabalho, com excessivo apego às regras, normas e regulamentos, em detrimento da valorização do contingente humano (SOUZA; SOARES, 2006).

Segundo Merhy (2006) o contexto histórico e sociocultural atual, tem exigido das instituições de saúde, modelos cada vez menos burocráticos e mais complacência, permitindo maior flexibilidade às instituições, as quais serão capazes de assimilar o que ocorre no seu interior e à sua volta, como também capazes de produzir soluções adequadas para cada adversidade que possa surgir, podendo assim repercutir na desburocratização das ações dos profissionais da saúde. 

Sendo assim, em determinadas situações a prática do enfermeiro se fundamenta nas necessidades tanto burocráticas quanto formais das organizações de saúde, de modo a privilegiar os objetivos organizacionais em detrimento do cuidado de enfermagem propriamente dito, o que pode causar desmotivação, tensões, conflitos e descrenças no âmbito do processo de trabalho na AB (TREVISAN, et al., 2006). 

Assim, ao admitir essa lógica burocrática, as ações de gerência praticadas pelos enfermeiros, refletem uma prática mecânica, focada em tarefas, com atividades automáticas, que dificultam a sensibilização do enfermeiro acerca dos reais problemas de saúde dos usuários que buscam assistência nesse cenário de atuação (FERNANDES et al., 2010)

Entretanto, compreende-se que o registro do enfermeiro é uma ferramenta essencial para a realização das ações em seu cotidiano de práticas, uma vez que a partir dessas informações obtidas, por meio do das atividades burocráticas, o enfermeiro poderá construir um plano de ação que possa atender as reais necessidades dos usuários do serviço. Nota-se que a dificuldade está na forma arcaica como as fichas, notificações e mapas são desenvolvidas, sendo o enfermeiro na maioria das vezes o responsável por uma gama de informações (FERNANDES, 2012).

Em decorrência desse excesso de atividades burocráticas, há uma influência na assistência prestada aos usuários pois, de certa forma, o enfermeiro tem responsabilidades tanto burocráticas quanto assistenciais, impossibilitando assim uma melhor sistematização do cuidado de enfermagem, devido as inúmeras responsabilidade de registros, em que o enfermeiro demanda tempo para realizar, interferindo negativamente no processo de trabalho, onde notou-se no DSC dos enfermeiros, ausência em certas situações de cuidado direto ao aos sujeitos, família e comunidade, para resolver questões burocráticas. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme o discutido e abordado no estudo, o enfermeiro enquanto profissional do cuidar e que presta cuidados, por meio das atribuições assumidas na UBS, não proporciona a qualidade da assistência planejada, em decorrência das sobrecargas com questões burocráticas que perpassam os serviços de saúde, onde todo o consumo do mês é de sua responsabilidade, uma vez que assume a função de gerente. Logo propõe-se que o profissional de enfermagem delegue funções aos demais envolvidos e constituintes da equipe, formando um gerenciamento compartilhado, não sobrecarregando apenas um profissional, criando um novo modelo gerencial. Desta forma contribui para a melhoria da gestão e com a oferta de serviços de qualidade na garantia da assistência integral a todos os atores sociais. 

DESCRITORES: Gerenciamento. Processo. Enfermagem. Atenção Primária à Saúde.

REFERÊNCIAS
FERNANDES, M. C. et al. Análise da atuação do enfermeiro na gerência de unidades básicas de saúde. Rev. Bras. Enfermagem, Brasília, n. 63, v. 1, fev. 2010.
FERNANDES, M. C. Processo de trabalho do enfermeiro na estratégia saúde da família: enfoque na gerência do cuidado. 2012. 106f. Dissertação (Mestrado Acadêmico Cuidados Clínicos em Saúde). Universidade Estadual do Ceará, Centro de Ciências da Saúde, 2012.
LORENZETTI, J. et al. Gestão em saúde no Brasil: diálogo com gestores públicos e privados. Texto & Contexto Enfermagem, n. 23, v. 2, p. 417-25, 2014.
MERHY, E. E. Em busca do tempo perdido: micropolítica do trabalho vivo em saúde. In: MERHY, E. E.; ONOCKO, R. (org.). Agir em Saúde: um desafio para o público. São Paulo: HUCITEC, p. 71-112. 2006.
SILVEIRA, D.S. et al. Gestão do trabalho, da educação, da informação e comunicação na atenção básica à saúde de municípios das regiões Sul e Nordeste do Brasil. Cad. Saúde Pública, n. 26, v. 9, p. 1714-26, 2010. 
SILVA, K. et al. Gestão da qualidade total nos serviços de Saúde: modelo gerencial em desenvolvimento. Rev. Eletrônica Gestão & Saúde, 2015.
SOUZA, F. M.; SOARES, E.. A visão administrativa do enfermeiro no microssistema hospitalar: um estudo reflexivo. Rev. Bras. Enfermagem, Brasília, n. 59, v. 5, p. 620-25, 2006.
TREVIZAN, M. A. et al. Gerenciamento do enfermeiro na prática clínica: problemas e desafios em busca de competência. Rev. Latino- Americano, Enfermagem, Ribeirão Preto, n. 14, v. 3, p. 457-60, jun. 2006.